O São Paulo sob o olhar de uma criança

(Foto: Álvaro Logullo)

Levei meu irmão ao Morumbi no último jogo.

Ele saiu da escola e só deu tempo de passar em casa para trocar de camisa. Colocou o uniforme do São Paulo e então partimos para o estádio. Quarta-feira, 21h45, trânsito, aula no dia seguinte… mas lá estávamos nós.

Tiago conheceu o Morumbi ano passado. E na primeira vez tudo impressiona. O tamanho do estádio, a cor da grama, a quantidade de pessoas, o barulho, a visão lá de cima. Ele foi quatro vezes durante 2017, sempre com grande públicos, 40, 50, 60 mil pessoas.

Mas o jogo em si nunca foi a atração principal. Tem a ida ao estádio, o lanche antes de entrar, a caminhada pelos anéis, a espera sentado. E mesmo que ele preste mais atenção no mascote do São Paulo lá embaixo, no sorvete durante o intervalo ou nos palavrões que a torcida grita, o importante é que ele sinta a atmosfera de um jogo do tricolor.

Dessa vez o estádio estava vazio. Entramos em cima da hora, o hino do Brasil já estava acabando. Nem tínhamos nos acomodado direito e o São Paulo marcou um gol. “Mas já?”, ele me perguntou. “O São Paulo está melhor esse ano”. Parecia que seria noite de goleada.

Só que o resto do jogo foi duro de assistir. Um time lento em campo, descompacto, sem profundidade. Um time que não cria jogadas, vacila defensivamente, deixa espaços no meio campo. Um time que dava raiva de ver! Mas para o Tiago, um time que estava ganhando por 1 a 0.

O jogo já se encaminhava para o fim quando um torcedor soltou um xingamento contra o time. Tiago virou para mim e perguntou: “Por quê ele está xingando o São Paulo?” Respondi: “Porque não estamos jogando bem”. Ele fez um breve silêncio, pensou um pouco e retrucou: “Mas como não? O outro time não fez nenhum gol até agora”. Parei para pensar nessa resposta por alguns minutos.

Tudo é muito mais simples para uma criança. Desde ir ao estádio, sentar na arquibancada, assistir o jogo, vencer uma partida. Ele não viu o jogo horroroso do São Paulo. Não viu o buraco que o time deixou no meio de campo. A troca de passes inefetiva, os erros do Marcos Guilherme, a falta de mobilidade do Diego Souza, as caneladas do Petros, as mudanças inúteis do Dorival. Nada disso ele viu. Ele viu um jogo de futebol. E se divertiu.

Tiago tem 8 anos. Com essa mesma idade vi o São Paulo ser campeão de quase tudo em 2005. Paulista, Libertadores, Mundial, um título atrás do outro. Impossível será repetir tal feito este ano. Se não bastassem os resultados ruins da equipe, o futebol apresentado também não convence, nem mesmo quando ganha. Talvez esse sentimento explique o público de apenas 10.278 no Morumbi nesse jogo contra o Bragantino. Em 2017 inteiro não houve um público tão pequeno quanto esse. A paciência tem limite.

A insatisfação é nítida na expressão dos torcedores. Xingamentos, vaias, lamentações. Durante um jogo do São Paulo o que mais se ouve é aquele “burburinho” de angústia vindo das arquibancadas. Olho então para o lado e vejo meu irmão. Nada disso passa na cabeça do Tiago. Quando estamos no estádio, pouco importa a situação do time. O jogo pode estar horroroso, equipe jogando mal, ele não liga. Assiste e torce pelo São Paulo como se fosse o melhor time do mundo. Ninguém pode dizer o contrário e nada vai tirar a graça de viver esse momento.

O jogo termina. Vitória do São Paulo por 1 a 0, mas a torcida demonstra o mal estar através de vaias. Não esboço reação e começo a me arrumar para ir embora. Estou decepcionado. Enquanto isso, ao meu lado, Tiago ergue os braços e comemora. Paro e reflito novamente.

Seu gesto me ensinou algo. Tudo aquilo é mais que “só” um jogo de futebol. Ganhando ou perdendo, é uma vivência, uma memória, uma lembrança que ficará pra sempre, assim como lembro de minhas experiências no estádio com sua idade. Talvez deva encarar minhas idas ao Morumbi como o Tiago. Com alegria, simplesmente por estar lá, assistindo meu time de coração. O Morumbi é nossa segunda casa, nosso templo sagrado, e antes do resultado sobrepõe-se o nosso amor pelo São Paulo Futebol Clube.

Por isso, tomo a liberdade de fazer um pedido ao torcedor são-paulino: Vá ao estádio!

Se você ama o São Paulo e o futebol, não deixe que a fase ruim do time desanime você. O tricolor está jogando mal? Sim, está. O Morumbi é bem localizado? Não é, a logística é difícil. Não podemos nunca deixar de demonstrar preocupação com a violência nos estádios, entendo quem tem receio de levar crianças ao estádio e não questiono. Inclusive já passei por uma situação difícil junto de meu irmão, quando vimos a depredação de um metrô após o jogo do São Paulo. Fiz questão de voltar com ele à um jogo para demonstrar que futebol não é vandalismo. Futebol é alegria. Por isso reitero o pedido.

Aproveite o ingresso que não está caro, separe um sábado, um domingo ou mesmo um dia de semana. Leve seus filhos, filhas, sobrinhos, netos, primos, enteados. Podem também ser amigos, pai, mãe, tios, avós, namorada, namorado. Incentive o amor deles pelo São Paulo e desfrute desse momento como um todo, não apenas condicionando ao resultado da partida.

Quando se é adulto, as pequenas coisas parecem não satisfazer mais nossas necessidades. Se o desempenho do São Paulo me irritou nesta quarta, compartilhar essas poucas horas com meu irmão me fez esquecer a frustração.

(Foto: Reprodução)

Álvaro Logullo

Álvaro Logullo

21 anos, estudante de jornalismo e devoto do São Paulo FC. Filho, neto, irmão e sobrinho de são-paulinos. Apaixonado por estádios de futebol, pretendo ir a todos os jogos do Tricolor, no Morumbi, em 2018. Porque se a fase é ruim, o amor é eterno!

Deixe um comentário

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.