O Mundial que todo mundo viu – por pouco

Eu já tinha visto muita coisa boa com o São Paulo. Muitas ruins também, é bem verdade. Aquele período em que o São Paulo vivia perdendo em jogos decisivos, sobretudo em clássicos, tinha me marcado. Ser o time que sempre jogava bem e chegada e pouco ganhava me deixava pistola da vida. Pra um pré-adolescente, ver os rivais corinthianos e até mesmo os santistas (que eram poucos naquela época, é bem verdade) te zuando até dizer chega era algo agoniante. Aí veio 2005.

Ah, 2005! Já começou bom. O time tinha conseguido uma vaga pelo segundo ano consecutivo na Libertadores (lembre-se: o São Paulo ficou uma década completa sem conseguir chegar ao torneio), nadou de braçada no Paulistão e conquistou o título em pleno SanSão – em Mogi Mirim (ah, o medo litorâneo…), em um chatíssimo campeonato de pontos corridos, é verdade.

Ao contrário de outros tantos, eu acho bom demais ganhar o Paulistão. Você ganha do seu rival. Você manda no seu pedaço. Você crava a espada no seu vizinho. É maravilhoso. Mas aquele time podia mais. Isso era óbvio pra todo mundo.

E nem mesmo a estranha saída de Emerson Leão, logo após o Paulistão, deixou essa impressão menos intensa. Se perdeu a fantasia e o encanto do polêmico, ganhou o pragmatismo de Paulo Autuori. Perdeu, também, um dos grandes homens-gol da história do futebol brasileiro: Luizão. Mas ganhou uma dupla de ataque pra lá de espetacular e carismática: Amoroso e Aloísio Chulapa.

A Libertadores de 2005 veio de maneira razoavelmente tranquila, convenhamos. Com exceção do nervosismo contra o River Plate (algo natural, convenhamos), em que o São Paulo venceu os dois jogos, por sinal, a grande dificuldade daquela campanha foi saber se o SPFC viajaria para Porto Alegre ou para Curitiba no primeiro jogo da final contra o Atlético-PR – ou, hoje, nesse nome horroroso com “h”: Athletico-PR.

Aqueles pouco menos de seis meses do título da Libertadores até o Mundial de Clubes teve um SPFC vagaroso. Deu pra ganhar do Corinthians, ver a vitória sumir no tribunal (curioso, bem dessa vez o roubo foi pra Justiça…) e, por fim, deixar escancarado o quanto o futebol brasileiro é zoneado na Máfia do Apito e naquele pênalti no Tinga que virou expulsão do Tinga.

Seriedade mesmo, só no Japão.

O pior é que o primeiro jogo foi complicado. Aquele Al-Ittihad, que absolutamente ninguém conhecia, complicou no primeiro tempo. Pior: mesmo com o 3×2, o Liverpool, depois dos inapeláveis 4×0 contra o Saprissa, não deixava crer que daria pro trimundial vir.

Veio.

A história do jogo todo mundo se lembra. Aloísio pra Mineiro, a invasão de campo, a defesa de Rogério Ceni, os três gols anulados. E bem anulados. E é sobre o último que versa essa crônica.

Ao contrário do que acontece na semifinal, o SPFC toma um baile no segundo tempo. Quase aos 43 minutos do segundo tempo, Sinama Pongolle, um jogador de pouco destaque nascido nas Ilhas Reunião (desafio: fale o que você fala das Ilhas Reunião sem pesquisar no Google), marcou o gol de empate. Abaixo você vê o momento:

Perceba que, assim que o atleta marca o gol, Galvão Bueno fica calado por alguns instantes. Enquanto isso, todo mundo comemora. Sinama Pongolle sorri e abre os braços.

Imagine eu, com 13 anos de idade, vendo o sonho de ganhar o mundo ruir. Segundos depois, tudo muda. Foi mais um gol anulado – e bem anulado, diga-se. E quase que o mundo de toda a minha família também é mudado.

Assim que eu vejo que o gol foi anulado, eu dou um berro que eu não sei de onde veio. Na mesma hora, jogo uma corneta, que estava na minha mão (muito mais pra curar o nervosismo que pra ser soada) contra o chão. Minha irmã do meio, na época com seis anos de idade, é atingida de raspão no olho.

Eu fico em choque. Meu pai dá um berro que eu jamais vou esquecer. Choro – que durou pouco, é verdade.

Minutos depois, a confirmação do título. Óbvio que todos os envolvidos no parágrafo acima comemoraram. Mas, da minha parte, eu ainda estava claramente amoado. Ao ver aquilo, também meu pai clareou a minha mente. Ele virou pra mim e falou: “Seu time é tricampeão do mundo! Comemora!”

Aquela frase fez com que tudo voltasse ao normal. E a corneta tornou-se apenas um pequeno detalhe naquela manhã de 18 de dezembro.

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