O último ano de mandato de Carlos Augusto de Barros e Silva, o Leco, trouxe à tona todas as incertezas que talvez o torcedor mais distraído ainda não via como um problema real. A dívida do clube alcançou níveis preocupantes – muito causada pela utilização dos recursos em contratações questionáveis – e tomou os noticiários esportivos. Para o torcedor mais preocupado, o medo do futuro começou a ficar ainda mais evidente e a gestão em atividade parecia estar em contagem regressiva para o fim de sua participação nisso tudo.
O time naquele momento era comandado por Fernando Diniz, uma escolha polêmica e inesperada, que chegou ao clube no fim de 2019 com a missão de conseguir a classificação para a Libertadores. Assim como a contratação, a manutenção do técnico para a temporada seguinte também virou motivo de debates. Mas o elenco e a diretoria pareciam convictos, alinhados e decididos a sustentá-lo até quando fosse possível. Foi o que fizeram.
O São Paulo, que historicamente tem notáveis e vitoriosos trabalhos a longo prazo, se perdeu dessa característica por um tempo (e não apenas disso). O que ajudava a compreender a eterna sensação de reconstrução. Por isso, se a insistência da última gestão em um treinador – seja pela dita e repetida convicção no trabalho ou pela simples indiferença com o futuro que não os pertencia mais – serviu para algo, foi para ressaltar que as trocas de treinador não deveriam ser constantes.
A gestão de Julio Casares assumia o clube e pregava um discurso sobre austeridade financeira e transparência. As primeiras declarações alertavam sobre a situação caótica em que encontraram as finanças do clube, mas não deixavam evidente como mudariam o cenário. Pareciam querer romper com tudo e começar outra reconstrução. A da vez começou com a contratação de Hernán Crespo, tido como um perfil que não romperia totalmente com o trabalho anterior. Ele chegava para treinar um elenco pressionado pela falta de títulos e frustrado depois de deixar o heptacampeonato brasileiro escorrer pelas mãos.
Vamos falar sobre 2021
Desde os primeiros momentos da nova temporada, a conquista do Paulistão, primeira – e menos importante – competição do ano, era tratada como prioridade absoluta para os rumos do restante dos meses. Tudo isso na busca incessante por sair da fila, mas como quase tudo que envolve os que comandam o clube, pareciam esperar que o título Paulista agisse também como o pontapé inicial para uma nova fase vitoriosa. Algo meio místico, como o que aconteceu em 2005. Mas se esqueceram de uma coisa: não existe fórmula mágica.
O elenco emendou uma temporada na outra e se esforçou – influenciado também pelo desejo da diretoria – para conseguir a tão almejada conquista, que poderia significar aquela “virada” na história deles pelo clube e um começo animador para os que acabavam de chegar. Em meio a isso, o Campeonato Paulista teve um mês de parada sem jogos, o que serviu para a nova comissão técnica conhecer e treinar o elenco, mas cobrou um preço caro depois. Jogos a cada 48h e o início do Brasileirão e Libertadores batendo na porta.
Título estadual e começo empolgante
A escolha era justificável por se tratar de fases decisivas e de um título mais próximo, mas chocou alguns que viram a fase de grupos da Libertadores, competição que o são-paulino ama como ninguém, ser preterida. O desfecho? Uma campanha consistente e o título diante do rival. Tudo parecia perfeito, o subestimado elenco tirou o time da fila de títulos e o jovem e recém chegado técnico caía nas graças da torcida com um começo de trabalho muito bom.
O título foi emocionante, afinal, era duro demais ver quem sempre foi sinônimo de êxito e conquistas, ficar tanto tempo sem ganhar nada. Só que passada a euforia, a realidade voltou a preocupar. O São Paulo no Brasileiro teve o seu pior início de campeonato da história. Na Libertadores, a classificação para a fase mata-mata foi mais difícil do que o esperado, mas aconteceu. Já na Copa do Brasil, uma derrota na estreia mostrou as fragilidades dos jogadores reservas, mas uma sonora goleada veio para confirmar a classificação.
Algo unia e explicava toda a dificuldade enfrentada: as intermináveis e seguidas lesões. A justificativa geral para não conseguir contar com os jogadores era o esforço feito no Paulista e a temporada emendada. Mas parecia uma resposta simples e realista, até aparecerem as lesões também em quem não havia jogado o torneio. De repente, Hernán Crespo se via em fases decisivas das competições tendo que contar com jogadores questionáveis e em má fase. O primeiro dos golpes veio na Libertadores.
Os golpes duros…
Nas quartas de final, o reencontro com o Palmeiras, aquele mesmo que assistiu de camarote o fim da fila de títulos acontecer diante dele. O rival para quem jamais tinha perdido em fases de mata-mata na competição continental. Apesar do histórico desfavorável, o cenário que os aguardava era bom: semana livre para treinamentos e o elenco todo à disposição. Já o São Paulo chegava desfalcado – agora a justificativa para a demora na recuperação incluía também a defasagem dos equipamentos – e sem dinheiro para contratar reforços.
A disparidade dos elencos era um fator conhecido por todos, mas o futebol vai além das obviedades. O São Paulo abriu o placar e viu o rival se perder em campo por um tempo, mas não aproveitou. O empate veio numa falha absurda de Volpi, que em algum momento da história recente tinha sido decisivo contra aquele mesmo Palmeiras. O gol sofrido em casa trazia a sensação de que agora a classificação seria mais difícil.
O jogo de volta uniu todas as decepções da temporada em 90 minutos. A começar pelos desfalques, gols perdidos pelo centroavante questionado, novas falhas do goleiro, desatenção do time e alterações ruins do técnico. Um festival de erros que culminou no fim do sonho do Tetra nesse ano. Foi um golpe duro, mas infelizmente não parou por aí. Ainda tinha a Copa do Brasil pela frente, o sonho (ou pesadelo?) antigo. O adversário? O Fortaleza, dessa vez sem o Ceni.
Fim da linha também na Copa do Brasil
O primeiro jogo aconteceu no Morumbi e o desfecho teve seus requintes de crueldade. Depois de abrir dois gols de vantagem, o que garantiria uma vantagem significativa e tranquilidade para o jogo de volta, o time levou o empate nos 10 minutos finais da partida. Entretanto, com mais uma falha de Volpi no primeiro gol e com uma desatenção imperdoável para um jogo mata-mata, no segundo. O São Paulo mais uma vez deixou a vantagem escapar.
Uma pausa de 14 dias sem jogos apareceu no caminho e poderia significar um sopro de esperança para a recuperação de todos os lesionados e correção dos erros. Nenhuma das coisas aconteceu. Para o jogo de volta, um time bem próximo do ideal, mas ainda sem todos à disposição, e um futebol que deu desgosto desde os primeiros toques na bola. O São Paulo jogou muito mal, desempenho quase insuportável de acompanhar.
O placar final foi de 3×1 para o Fortaleza. O goleiro, que naquele momento só era titular por falta de opção, falhou por duas vezes e ainda assistiu de perto o terceiro gol, que veio para sacramentar a eliminação já sentida desde o apito inicial. Seria injusto ignorar o desempenho terrível de todo o time – sem exceção – e comissão. A culpa é coletiva – como quase sempre – mas ainda assim, alguns se esforçaram bastante para ter uma parcela maior dela.
O futuro é no Brasileirão
O São Paulo tem um turno inteiro do Brasileiro pela frente, competição em que está mais próximo do que deveria da zona de rebaixamento. Para o futuro esportivo e financeiro que planejaram para a próxima temporada, a classificação para a Libertadores é fundamental. Para conseguir isso será necessário um desempenho muito melhor e, de preferência, com todos à disposição. Ou seja, daquele sonho de repetir 2005, talvez tenha faltado olhar para tudo o que o 2021 pedia.
Por hoje é isso. Até a próxima!
Julia Robita – @juliarobita